Uma reportagem feita em 2010 pelo canal BBC, de Londres, revelou dados alarmantes sobre o turismo sexual no Brasil. De acordo com uma investigação realizada pela emissora, as crianças e adolescentes são os atrativos principais para a vinda de turistas em busca de sexo fácil. São meninas que “vendem” a hora por 5 dólares em troca de serviços. Para estas jovens, os dez clientes que costumam ter por noite são suficientes para a compra do crack, droga muito comum nesta área. Estima-se que mais de 250 mil crianças brasileiras estejam perdendo a infância para a prostituição.
Outro drama vivido por estes brasileirinhos se refere ao aliciamento por parte de traficantes para integrar uma quadrilha. Muitos se iniciam no mundo do tráfico em comunidades como “olheiros”, onde cumprem a função de avisar os demais companheiros sobre a entrada da polícia ou facções rivais. Munidos de armas potentes, estas crianças em sua maioria vêm de lares onde a situação financeira dos pais é crítica e, assim, acabam se deixando levar pelo fascínio do dinheiro fácil.
O drama de Bárbara
Bárbara Oliveira, de 29 anos, cresceu em um lar destruído. A mãe era traficante e usuária de drogas. Com medo que a matassem, ela a trancava em casa a fim de protegê-la. “Minha mãe era viciada em cocaína, bebia bastante e de 6 em 6 meses se relacionava com mulheres. Eu presenciava tudo isso e nunca conheci o meu pai. Ela serviu aos encostos por 17 anos e quando os largou, a situação só piorou”, conta.
Tentando melhores condições de vida e a proteção da mãe, que aos poucos foi perdendo o controle da própria vida e de seus atos, Bárbara começou a traficar no lugar dela, passando a andar armada. “Eu era conhecida como a ‘princesinha do pó’ e só andava bem-arrumada. Nessa época, estava morando com um traficante. Era respeitada, considerada, vivia uma vida de rainha, mas era deprimida, infeliz. Despertava inveja nas outras mulheres; mesmo sem querer, fiz inimizades. Até pela inexperiência, pois era uma criança e me tornei intolerante. Apesar de nunca ter matado ninguém, gostava de ver as pessoas morrendo. Eu não tinha mais sentimento algum por nenhum ser humano”, comenta.
A morte da mãe de Bárbara era uma tragédia anunciada. Totalmente dominada pelo vício, nos momentos de lucidez implorava para que ela não usasse drogas. “Lembro que me pedia isso constantemente... Era uma mulher linda, mas que se destruiu com o vício. Eu a amava demais e, pensando que a estava ajudando, levava cocaína para ela, pois sem a droga ela ficava louca, quebrava tudo o que via pela frente. Na minha concepção da época, era uma forma de tentar ajudá-la.”
Mas todo o esforço da filha não foi capaz de salvá-la da morte. Um ano depois, quando Bárbara tinha 14 anos, sua mãe foi assassinada por traficantes. “A morte dela foi brutal. A molestaram sexualmente, estrangularam, deram um tiro na cabeça e ainda queimaram o corpo dela na rua. Não pude identificar o cadáver no Instituto Médico Legal (IML), porque estava irreconhecível e eu era menor de idade”, revela.
Após o assassinato da mãe, ela se viu praticamente só, sem família ou parente algum, além da irmã. Foi nesta época, que Bárbara encontrou abrigo na casa de Rachel de Carvalho Oliveira, de 66 anos, a quem chama carinhosamente de mãe. “Ela sempre passava alguns períodos em minha casa, mas após a morte da mãe, ela acabou ficando por mais tempo”, declara.
E agora? O que faço?
Lágrimas, um enterro simples e duas filhas desamparadas. Assim terminava a história de Sandra, mãe de Bárbara. “Ficamos sentadas no meio- fio, chorando e sem saber para onde ir. Decidi fugir com a minha irmã. Como somos filhas de pais diferentes, a levei para a casa dos avós paternos e fui viver a minha vida, mas prometi que um dia voltaria para buscá-la. Neste momento vi o quanto a minha vida era desgraçada. Chorei por mim e por minha irmã que tanto amava”, recorda sem conter as lágrimas.
Ódio, muito ódio. Desprezo pelas pessoas, ausência de sentimentos bons e perspectivas. Assim ficou a adolescente ao constatar que estava sozinha e sem rumo.
Aliciada pela prostituição
Com a vida destruída e sozinha, com 15 anos, ela saiu de São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro, para tentar uma nova vida na capital. Com saudades da irmã, passando fome, sem casa, à mercê da violência urbana, a vontade de Bárbara era morrer. Por diversas vezes ela relata ter tentado o suicídio, mas, por causa da promessa feita à caçula, acabava desistindo da ideia. Ao chegar a Copacabana, zona sul do Rio, Bárbara foi aliciada por uma mulher para ser garota de programa, mas ao se deparar com as meninas mais experientes, recuou.
“Elas me disseram que meu corpo não suportaria o ‘ritmo de trabalho’ e que, para isso, eu precisaria cheirar muita cocaína. Apesar de ter crescido no meio do tráfico, eu nunca usei, pois tinha medo de me tornar uma viciada como a minha mãe. Não aceitei e saí correndo. A dona da casa me bateu e disse que eu não precisaria fazer programas, somente atender as ligações e lavar as roupas de todas as outras prostitutas. Aceitei porque não tinha jeito, eu precisava comer. Mas lavava roupa de mais de 20 pessoas. Ficava exausta”, conta.
A beleza da jovem chamava atenção dos clientes que a assediavam, oferecendo altas quantias por um programa com ela e a cada recusa apanhava da cafetina.
Água gelada? Não, água do vaso sanitário
“Após tanto sofrimento, eu fui evangelizada por um rapaz, que hoje já morreu. Ele havia se afastado da Igreja Universal do Reino de Deus e me disse: ‘Vou te levar a um lugar que vai mudar a sua vida. A minha não mudou porque eu não quis, mas você precisa ter essa oportunidade’. Eu fui por consideração, pois não acreditava que minha vida poderia ser transformada. A única coisa que ele me pediu foi para abrir meu coração quando chegasse lá”, lembra.
Bárbara conheceu a IURD de Botafogo ainda com 15 anos. Segundo ela, a libertação não foi fácil, mas ela perseverou por acreditar que aquela era sua última chance. “Quando a cafetina descobriu, passou a me dar comida estragada e água do vaso sanitário. Ela também não me deixava tomar banho, para que na Igreja as pessoas sentissem o mau cheiro e não me aceitassem. Mas isso não aconteceu, pelo contrário, as obreiras me tratavam como filha”, conta.
Sem ter outro lugar para ir, algumas vezes dormia na casa da cafetina, onde era trancada ou passava a madrugada na praia de Botafogo a fim de conseguir participar das reuniões. “Na casa dela, se eu quisesse comer comida fresca ou beber água gelada a condição era não ir para a IURD, mas eu perseverei, porque tinha a certeza de que era lá que a minha vida ia mudar”, enfatiza.
Determinada a ter a vida transformada, Bárbara buscou e alcançou a libertação, porém, o sentimento de mágoa persistia e não conseguia perdoar aqueles que lhe fizeram tanto mal. “Me batizei nas águas e, como eu ainda morava na rua, as outras pessoas achavam que eu não tinha mudado em meu interior, mas, a transformação total obtive quando eu consegui perdoar. Em seguida, fui batizada com o Espírito Santo, aí consegui amar todos os que fizeram mal a mim e a minha família”, diz.Após a conversão, Bárbara cumpriu a promessa feita à irmã. “Só voltamos a nos ver quando ela voltou para me buscar. Ela cuidou de mim e hoje é uma grande mulher de Deus. A vida dela hoje é só vitória”, diz a irmã Cíntia Cristina da Silva Longobuco, de 23 anos, no que concorda a amiga Vanessa de Oliveira, de 31.
“Estudamos juntas na adolescência. Acompanhei a sua luta com a mãe dela que era viciada em drogas, chegando ao ponto de dever aos traficantes e sendo morta por eles. Quando isso aconteceu, Bárbara ficou desnorteada. Ela entrou de cabeça na vida do crime, foi mulher de traficante. Apesar de ter medo de usar drogas, se envolveu muito na vida do crime. Graças a Deus foi transformada pelo Poder de Deus”, garante.
Uma nova mulher
O esposo de Bárbara, pastor Claudio Oliveira, que na época era membro do Força Jovem, observava o comportamento dela e acompanhou o processo de libertação e conversão da garota. “Muitas pessoas, quando souberam que me interessei por ela, me falavam para desistir porque ela só ia me atrapalhar. Nem mesmo as pessoas de dentro da Igreja acreditavam na mudança. Começamos a conversar, oramos e, como ela ainda morava na rua, pedi para que fosse morar com a minha irmã”, revela.
Cerca de um ano depois, eles se casaram e hoje servem a Deus no altar. “Somente o Deus Vivo, que é amor, poderia fazer o que Ele fez por mim. Eu falo para esse rapaz, para essa jovem, que há um caminho de vitória, há um Deus que pode tirá-lo dessa situação, desse barraco, dessa vida de sofrimento. Ele quer te dar a paz, que é o que eu tenho hoje”, assegura Bárbara.
FONTE: FOLHA UNIVERSAL
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