Por Elliana Garcia / Fotos: Plínio Zúnica
Se Aírton da Costa, de 44 anos, fosse olhar apenas para a sua realidade, jamais teria ousado sonhar. Mas as dores, decepções e dificuldades o ajudaram a escrever uma história de persistência. Hoje, mais do que ninguém, ele pode dizer que nunca é tarde para realizar um sonho.
Aírton nasceu em Lins, no interior paulista, em uma família desestruturada e sem nenhuma condição de uma vida digna. A mãe trabalhava como diarista, o pai era viciado em bebida alcoólica. Sem eira e nem beira, aos 5 anos de idade já vivia pelas ruas junto com mais três irmãos, revirando o lixo em busca de comida, pedindo esmolas e dormindo ao relento. Às vezes, passava até 30 dias longe de casa, sem ninguém sentir a sua falta. Aos 6 anos de idade ouviu que advogados resolviam várias coisas e ajudavam muitas pessoas. Nascia ali, no coração do menino, o desejo de também ser advogado.
Aos 7 anos entrou na escola, mas continuou na rua até os 10 anos, catando papelão para ajudar a família e revirando o lixo em busca de comida. E foi no lixo que ele encontrou livros que lhe mostraram novos horizontes. Já alfabetizado, o garoto lia o que via pela frente. Sabia que era na educação que teria uma nova oportunidade na vida.
Mas o caminho entre o sonho e a realidade era muito longo. Porém, era preciso dar os primeiros passos, e foi o que Airton fez. Dedicou-se aos estudos e entre 11 e 13 anos, em vez de catar papelão, fazia pequenos trabalhos nas casas, como limpar quintal e cuidar de jardins. Aos 14 anos surgiu a oportunidade em uma empresa para trabalhar como aprendiz. Aliado à escola e ao novo trabalho, agarrava qualquer fresta de esperança que pudesse deixá-lo mais perto do seu objetivo.
Fez vários cursos no Senai, na área de mecânica e, aos 21 anos, foi para a capital paulista e, posteriormente, para Diadema, no ABC paulista, para trabalhar como torneiro mecânico. “Mas entrar em uma faculdade ainda era um sonho distante”, relata.
O tempo passou, mas a chama do sonho de Airton tornar-se um advogado nunca se apagou. Ele casou, teve uma filha, hoje com 17 anos. Até que, aos 35 anos de idade, ficou mais próximo de alcançar o seu objetivo. “Lembro que passei em frente a uma faculdade e havia uma faixa dizendo que faltavam três dias para o vestibular”. Ele não teve dúvidas. Fez a inscrição para o vestibular, foi aprovado e, em seguida, matriculou-se no curso de direito.
Faculdade
No ano de 2000, Aírton enfim começava a faculdade. “Eu não sabia como pagaria a mensalidade, pois tinha uma família para sustentar e o curso não era barato. Na verdade, eu não tinha nem roupa para estudar. Tinha apenas duas calças”, diz.
Mas, dedicação era a palavra, tanto nos estudos quanto no trabalho. Airton entrava na empresa às 8 da noite e saía ás 5 da manhã. De lá, ia para a faculdade, onde entrava às 7h e saía às 11h30. Na parte da tarde, dormia, e depois fazia os trabalhos de escola. Sua dedicação aos estudos lhe rendeu ótimas notas e, no trabalho, acumulava horas extras. “Para alguns colegas eu era um puxa saco da empresa. Mas só eu sabia do sonho que havia dentro do meu coração”.
No segundo ano de faculdade, Airton conseguiu um financiamento estudantil e, em dezembro de 2004, tornou-se bacharel em direito. Parte do sonho estava realizada. Faltava a outra: passar no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), para, enfim, tornar-se advogado. Na terceira tentativa ele conseguiu ficar entre os 6,6% dos aprovados.
“Não tinha palavras para expressar o que eu estava sentindo naquele momento. Eu havia esperado cerca de 30 anos para entrar na faculdade. E 35 anos depois, além de ter concluído o curso, estava recebendo a minha carteira da OAB. Sempre tive certeza de que um dia, não importava se aos 35, 40 ou 60 anos, eu conseguiria realizar meu sonho,” revela.
Fazendo história
O menino, que começou a vida buscando comida no lixo, agora era um doutor. Na primeira audiência representando um cliente diante de um juiz, ele se manteve sério. Mesmo usando um terno velhinho, não se intimidou diante de outros advogados e saiu do fórum com a vitória nas mãos. “Depois dessa primeira audiência, assim que cheguei em casa, chorei muito. Não só pela vitória, mas por todo o contexto, por toda a luta. Estar ali, fazendo o que sempre quis fazer diante de um juiz, foi maravilhoso demais. Não existem palavras que possam descrever esse momento”.
Hoje, Airton, que advoga na área civil e trabalhista e fez uma pós- graduação em direito, tem muitos clientes, mas não se esquece de quando passou a ter esse sonho. “Na minha concepção de garoto, o advogado resolvia as coisas, ajudava as pessoas, por isso faço questão de atender e ajudar aqueles que não têm condições de pagar um advogado”.
Por já ter morado na rua, ele diz que hoje tem outro olhar sobre essas pessoas. “Quem mora na rua sofre muito. Não é fácil. A fome é terrível. Comi até coisas podres. Quem vive na rua é tratado como lixo”, reflete.
Não desista
Airton tem ciência de que a sua história influencia muitas pessoas e deixa um recado: “Não desistam. Confiem em Deus. Eu creio que Deus vê a gente, como viu Davi, por quem ninguém dava nada. Só que Deus me deu forças para vencer e passar essa história adiante. Tem que acreditar no sonho. Eu esperei mais de 30 anos para realizar o meu. Eu não tinha dinheiro, só tinha a vontade.”
Há 5 anos como advogado, Airton nunca perdeu uma causa na Justiça. O segredo, segundo ele, é orientar os clientes a agirem com honestidade. “Trabalho com ética e digo para os meus clientes: ‘Faça o que é justo.’ Sendo honesto e orientando os outros a fazerem o mesmo, onde ponho a mão dá certo”.
Recompensa
O menino que nasceu num lar conturbado, hoje tem uma família abençoada e paz e prosperidade em sua vida. “Eu valorizo as pequenas coisas. Não tenho vergonha do meu passado. Por intermédio dele tenho ajudado muitas pessoas a terem objetivos em suas vidas. E esse é o meu lema, ajudar e inspirar outras pessoas a também lutarem pelos seus sonhos”, finaliza.
FONTE: ARCA UNIVERSAL
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